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O pacote fiscal “tímido” detalhado pelo governo nesta quinta-feira (28) criou um sentimento ruim no mercado e colocou pressão nas próximas decisões do Banco Central para a Selic, a taxa básica de juros. Os juros futuros dispararam e encerraram a sessão de quinta-feira (28) perto de 14% em alguns contratos. Ao longo do dia chegaram a níveis que não eram vistos desde o governo Dilma Rousseff.
Walter Maciel, CEO da gestora AZ Quest, vê um cenário de “elevação brutal” de juros na esteira dos últimos anúncios. “Dado o que o mercado está vendo agora de preço, o Banco Central teria de fazer duas altas de 100 pontos-base nos juros [1 ponto porcentual]”, afirmou, ao InfoMoney. Segundo Maciel, é o preço pago pela perda de credibilidade do governo em relação ao controle de gastos, após o controverso pacote de medidas anunciado.
Maciel diz que a AZ Quest foi uma das casas que mais apoiou o arcabouço proposto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no ano passando, apostando que não haveria mudança de meta de déficit zero. Agora, é explícito em dizer que o governo “encomendou um desastre” ao misturar corte de gastos com uma reforma de Imposto de Renda.
“O gringo agora jogou a toalha de vez”, afirma, acreditando que um fluxo estrangeiro de carry trade (motivado pela diferença de juros entre o Brasil e os Estados Unidos – onde as taxas estão caindo) não deve ganhar fôlego enquanto a questão fiscal não for tratada com seriedade.
Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital, destaca que apenas a rápida depreciação do real – observada desde quarta-feira (27) – já seria suficiente para mudar os rumos da política monetária no Brasil.
Ainda que mercado tenha sido tomado por um sentimento de decepção com apostas sobre uma alta de 0,75 a 1 ponto percentual na Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que termina em 11 de dezembro, Tatiana Pinheiro diz que ainda é cedo para falar em aumento do ritmo de aperto. Mas a economista observa que o pessimismo com o pacote fiscal trouxe rápida deterioração do cenário e pode mudar o rumo da política monetária.
O pessimismo que levou o dólar a R$ 5,98 no fechamento desta quinta-feira não deve deixar o mercado tão cedo, outro fator que pode justificar um BC mais favorável ao aperto monetário daqui para frente. “Precisaríamos de notícias adicionais no lado do controle de despesas ou notícias muito positivas no cenário internacional para melhora dos ativos locais”, diz a economista.
Essas notícias positivas não estão no cenário-base do mercado e, portanto, o movimento de alta do dólar viria para ficar, o que já acende um sinal de alerta para o Banco Central, que não quer deixar a inflação sair do controle.
Para o economista Igor Macedo de Lucena, o patamar de R$ 6 tende a ser um novo piso para o dólar daqui para frente.
“Se não houver um plano factível, no qual as pessoas acreditem que teremos controle e estabilização de gastos, e até mesmo superávit fiscal, que é o desejado, R$ 6 reais vira o piso”, explicou. Lucena prevê que ações do Banco Central não vão ser suficientes, já que o dólar tende a se favorecer de políticas de desoneração de impostos nos Estados Unidos a partir do novo mandato de Donald Trump.
“Com a tendência de desregulamentação do setor de óleo e gás e das Big Techs, com Elon Musk dentro do governo americano, a atração de recursos para os Estados Unidos vai ser muito forte”, diz Lucena.
“Acredito que vamos entrar, muito provavelmente, em projeto de dominância fiscal. Ou seja, se o fiscal não resolver, o Banco Central sozinho vai se tornar incapaz de controlar a taxa de inflação.”
O principal ponto de preocupação de Tatiana Pinheiro, da Galapagos, com o pacote fiscal é que “ele não é suficiente para estabilizar a dívida pública, que seguirá crescendo mesmo com expectativas otimistas de inflação, em 4% ao ano, e Selic voltando para um dígito em 2027”.
Nas contas da economista, a dívida pública pode passar de 100% do PIB em 2030 quando considerados os juros futuros precificados pelo mercado atualmente. No melhor cenário, com Selic abaixo de 10% a partir de 2027, a dívida ainda subiria para 93%. “O ajuste proposto é muito pequeno frente ao desequilíbrio entre receitas e despesas e tamanho da dívida brasileira”, avalia Pinheiro.
Outro ponto importante para a especialista da Galapagos é que as medidas anunciadas nessa semana dificultam ainda mais a manutenção do arcabouço fiscal a partir de 2027, já que seriam suficientes para gerar alívio orçamentário apenas em 2025 e 2026, o que traz necessidade de novos ajustes em três anos.
“De 2026 para frente, só com essas medidas, não consigo ver viabilidade de manutenção do arcabouço fiscal como está”
A economista explica que a dependência de aprovação do legislativo da maioria das medidas contribui para o ceticismo do mercado. “O Congresso acabou de aprovar um projeto de lei que consolida o valor das emendas e tira a possibilidade de bloqueios pelo governo e agora temos uma economia de R$ 6,7 bilhões projetada em cortes de emendas parlamentares que precisa ser negociada.”
No entanto, a economista-chefe da Galapagos pondera que o pacote tem seus méritos, como o controle dos supersalários e ajustes na previdência dos militares. “A questão é que as medidas não suficientes para cumprir seu objetivo, que é conter o impulso fiscal e a pressão em cima da demanda para não termos pressão inflacionária ou necessidade de juros mais altos do que temos hoje”, conclui.
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